terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Bibi Ferreira e o plebiscito de 1963


Meus caros, acredito que o título tenha sido no mínimo enigmático para muitos. Vamos aos fatos:

Na foto, João Goulart

Em 25 de agosto de 1961, Jânio Quadros renunciou à presidência da República. Assustados com a tendência esquerdizante de seu vice, João Goulart, substituto constitucional de Jânio, os paranóicos ministros militares pressionaram o Congresso a aprovar às pressas um ato adicional que limitasse os poderes do presidente, a fim de que ele não pudesse sair da linha política conservadora que as Forças Armadas preconizavam. A solução foi a Emenda Constitucional n°4, aprovada em 2 de setembro, e que instituiu o Parlamentarismo no Brasil. Dessa forma, o Congresso não responderia mais diretamente ao presidente, e sim a um primeiro-ministro que o próprio Congresso indicaria.


Tancredo e Jango

No dia 7 de setembro João Goulart assumiu a presidência com Tancredo Neves à ilharga, como primeiro-ministro. Ficou estabelecido que em janeiro de 65 haveria um plebiscito popular para a manutenção ou não do novo sistema de governo. O gabinete de Tancredo manteve-se caoticamente até junho de 62, quando finalmente caiu.

Em 10 de julho tornou-se primeiro-ministro o gaúcho Francisco Brochado da Rocha. Sua plataforma consistia basicamente em aprovar a antecipação do plebiscito para dezembro de 62. Não conseguindo, renunciou e foi substituído pelo baiano Hermes Lima. Embora tivesse renunciado, Brochado acabou logrando a antecipação do plebiscito, não para dezembro de 62, mas para o dia 6 de janeiro de 1963. A experiência parlamentarista mostrava sinais de fracasso e muito mais do que limitar o presidente, o que a emenda constitucional fez foi dar carta branca ao Congresso, o que no Brasil nunca foi a coisa mais prudente. Além disso, o Congresso era em tudo e por tudo um congresso presidencialista, e não foram raras as vezes em que Goulart interferiu em reuniões do gabinete de ministros, passando por cima do primeiro-ministro.
Bibi Ferreira

A classe artística mobilizou-se para que o parlamentarismo fosse derrotado no plebiscito. O sistema apenas descentralizava o poder central e criava uma série de caciques que desejava governar com o mesmo poder. Acredito que ao fim e ao cabo, o que os artistas desejavam era que Jango governasse do jeito que lhe aprouvesse, para o bem ou para o mal. Decisão semelhante ocorreu em 90, quando um novo plebiscito jogou nas mãos do povo a decisão entre república e monarquia, e parlamentarismo e presidencialismo. Contra todos os prognósticos (e desta vez os artistas cerraram fileiras ardorosamente ao lado do parlamentarismo), o povo derrotou a monarquia e o parlamentarismo com estrépito, mandando mensagem claríssima de que o problema nunca foi o sistema, e sim os políticos.

Bibi
Na época do governo Jango, o rádio ainda consistia em arma poderosíssima para as campanhas políticas, e os jingles eram capazes de vencer uma eleição. Para o plebiscito de 6 de janeiro de 1963, Bibi foi chamada para encabeçar uma das principais peças publicitárias do presidencialismo. Com pouco mais de 3 minutos, o jingle é feito nos moldes de um programa de rádio, com o apresentador, a estrela - Bibi - e os convidados especiais (Elizeth Cardoso, Ivon Cury, Isaurinha Garcia e Jorge Goulart), que cantam a mesma marchinha da campanha eleitoral de Jango para a vice-presidência, em 1960, trocando, apenas, a letra pelo novo mote, ou seja, a derrota do parlamentarismo. Esta é a transcrição:

Locutor – Aqui está a maior atriz do teatro nacional, Bibi Ferreira!

Bibi – Ao lado dos trabalhadores, dos estudantes, dos homens de empresa, dos funcionários, dos profissionais liberais, dos homens do campo, das donas de casa, também estarão nas urnas, dia 6 de janeiro, os grandes artistas do rádio e da televisão. Aqui está uma das mais queridas cantoras do Brasil: Elizeth Cardoso, a Divina. Canta, Elizeth!

Elizeth – (canta) Meu povo, está na hora de acabar a confusão, toda a nação vai responder que não. O ato adicional está indo mal, todo o meu povo, com razão, vai responder que não, não e não.

Bibi – E aparece Minas Gerais no grande show do plebiscito. Surge Ivon Cury! Astro de primeira grandeza, trazendo o apoio dos artistas das Alterosas. Ivon Cury!

Ivon – (canta) Nós vamos acabar com a confusão, é a nossa vez, no dia 6, ahhh, vamos dizer que não. O parlamentarismo não tem jeito nem razão, no dia 6 vamos dizer que não, não e não.

Bibi – Ouçam a seguir a notável cantora paulista Isaurinha Garcia, orgulho de São Paulo e do Brasil.

Isaurinha – (canta) O dia 6 vai ser a nossa vez, toda a nação, com o lápis na mão vai responder que não. Está na sua mão, do plebiscito a decisão, com o lápis na mão vamos dizer que não, não e não.

Bibi – Igual ao senhor e igual à senhora, eu também irei às urnas dia 6, o dia do não, e em sua seção eleitoral, prestigiando o plebiscito, estará também o famoso cantor Jorge Goulart, uma das mais bonitas vozes do Brasil.


Jorge – (canta) Nós vamos acabar com a confusão, é a nossa vez, no dia 6, vamos dizer que não. O parlamentarismo não tem jeito nem razão, no dia 6 vamos dizer que não, não e não.

Locutor – Na sua cédula está escrito:

Bibi – Concorda com o ato adicional que instituiu o parlamentarismo?

Locutor – Não.

Locutor – Então faça um X no quadrinho do não.

Locutor – Dia 6 é a sua vez.

Bibi – Compareça e marque:

Locutor – Não!

Locutor – Não!

Bibi – Não!
Locutor – Não!

Locutor – Não!

Bibi – Não!

Coro – Meu povo a decisão agora está em sua mão, no dia 6 vamos dizer que não. O ato adicional só aumentou a confusão, com o lápis na mão, vamos dizer que não, não e não.

Pode-se dizer que Bibi e a classe artística estavam do lado certo, porque no dia 6 de janeiro o parlamentarismo foi fragorosamente derrotado, com 9.457.448 votos pela volta do presidencialismo, contra 2.073.582 pela manutenção do regime de primeiros-ministros.

Divirtam-se assistindo esta clássica e rara propaganda política:


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site oficial de Bibi Ferreira, composto e dirigido por Ângela Glavam, é parada obrigatória para todos os admiradores de nossa maior atriz.

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Preciosidade: A Temporada de Bibi Ferreira em 1949


Meus caros, pretendia postar isto aqui no ano passado, para comemorar os 60 anos daquela temporada, mas vai agora, com pequeno atraso, inaugurando as postagens de 2010.

Entre abril e junho de 1949 Bibi e sua companhia estiveram em São Paulo apresentando três espetáculos: Senhora, adaptação do romance de José de Alencar por Hélio Ribeiro de Souza (carro-chefe da temporada, que estreou no Teatro Regina, no Rio de Janeiro, em janeiro daquele ano), Diabinho de Saias, (Dear Ruth, peça do americano Norman Krasha com tradução de Raymundo Magalhães Jr.), e Minhas Queridas Esposas, rara incursão de Bibi pela dramaturgia.

Em meio à pesquisa que venho empreendendo há tempos para meu livro sobre Jânio Quadros, encontrei acidentalmente este material preciosíssimo, que consiste na campanha publicitária das três peças. São anúncios que vêm em formato de desenhos ou fotos de Bibi, mas o que é realmente curioso é que não se repete jamais um comercial. Vemos a contagem regressiva para a estréia de Diabinho de Saias ou Minhas Queridas esposas, com clichês, figuras ou textos sempre diferentes.

Senhora tinha "mais de trinta artistas, entre os quais Bibi, Rodolfo Arena, Belmira de Almeida e Jardel Filho, com onze cenários feitos por sete palcos giratórios, trabalho de Paulo Elkins, brasileiro que havia feito muito sucesso na Europa e os elogiadíssimos figurinos de Sofia Magno de Carvalho". A crítica Ana Maria Mendonça, do Correio da Manhã,  não deixou passar em branco "a novidade dos palcos giratórios. Além de possuir as vantagens de auxiliar o ritmo da peça e de não prolongar demasiadamente os intervalos, produziu um efeito interessante: pode-se ver os artistas se movimentarem de uma sala para outra, enquanto o palco gira". (Bibi Ferreira, uma vida no palco


Um primor da publicidade nos anos 40 e um belíssimo mergulho no universo das companhias teatrais, numa época em que tínhamos, ao mesmo tempo em cartaz, aqui em São Paulo, Cacilda no TBC, Maria Della Costa em seu teatro, e Bibi no Teatro Santana.


Divirtam-se, salvem, divulguem. E dêem crédito a este blog, se lembrarem.



Abaixo, um lembrete sobre Diabinho de Saias, no Diário da Noite de 24 de maio de 1949:


Sobre a interpretação de Bibi em Diabinho de Saias, eis o que disse Paschoal Carlos Magno no Correio da Manhã: "Como atriz, é das que sabem ouvir, como se estivesse ouvindo de verdade o personagem a quem se dirige ou com ela conversa. Sua Miriam fica, por força dos detalhes com que a enriquece, mais simpática do que realmente é". (Bibi Ferreira, uma vida no palco)

A seguir, a contagem regressiva diária para o fim da temporada de Diabinho de Saias e a estréia de Minhas Queridas Esposas:




Em meio às propagandas, o aviso sobre uma festa teatral dada em homenagem à Bibi na antiga Boite Estoril:


E por fim, a estréia de Minhas Queridas Esposas, na sexta-feira, 10 de junho de 1949.

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O site oficial de Bibi Ferreira, composto e dirigido por Ângela Glavam, é parada obrigatória para todos os admiradores de nossa maior atriz.
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